quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

"Era uma vez um país onde era tudo proibido.
Ora como a única coisa não proibida era o jogo do mata, os súbditos reuniam-se em certos campos que ficavam por detrás do país e aí, jogando ao mata, passavam os dias.
E como as proibições vieram umas de cada vez, sempre por motivos justificados, não havia ninguém que achasse mal ou não soubesse adaptar-se.
Passaram os anos. Um dia os notáveis do país viram que já não havia razão para que tudo fosse proibido e mandaram arautos avisar os súbditos de que podiam fazer o que queriam.
Os arautos foram aos locais onde costumavam reunir-se os súbditos.
- Saibam - anunciaram - que já nada é proibido.
Eles continuaram a jogar ao mata.
- Não perceberam? - insistiram os arautos. - São livres de fazerem o que quiserem.
- Muito bem - respoderam os súbditos. - Nós jogamos ao mata.
Os arautos bem se afadigaram a recordar-lhes todas as ocupações boas e úteis que haviam tido no passado e poderiam ter novamente de agora em diante. Mas eles não ligavam e continuavam a jogar, um lance a seguir ao outro, sem pararem sequer para ganhar fôlego.
Vendo que as tentativas eram vãs, os arautos foram dizê-lo aos condestáveis.
- Resolve-se bem - disseram os condestáveis. - Proibimos o jogo do mata.
Foi então que o povo fez a revolução e os matou a todos.
Depois, sem perder tempo, tornou a jogar ao mata."
Quem se contenta, in A memória do mundo. Italo Calvino

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