
sábado, 29 de dezembro de 2007
A vida bate
Não se trata do poema e sim do homem
e sua vida
- a mentida, a ferida, a consentida
vida já ganha e já perdida e ganha
outra vez.
Não se trata do poema e sim da fome
de vida,
o sôfrego pulsar entre constelações
e embrulhos, entre engulhos.
Alguns viajam, vão
a Nova York, a Santiago
do Chile. Outros ficam
mesmo na Rua da Alfândega, detrás
de balcões e de guichês.
Todos te buscam, facho
de vida, escuro e claro,
que é mais que a água na grama
que o banho no mar, que o beijo
na boca, mais
que a paixão na cama.
Todos te buscam e só alguns te acham. Alguns
te acham e te perdem.
Outros te acham e não te reconhecem
e há os que se perdem por te achar,
ó desatino
ó verdade, ó fome
de vida!
O amor é difícil
mas pode luzir em qualquer ponto da cidade.
E estamos na cidade
sob as nuvens e entre as águas azuis.
A cidade. Vista do alto
ela é fabril e imaginária, se entrega inteira
como se estivesse pronta.
Vista do alto,com seus bairros e ruas e avenidas, a cidade
é o refúgio do homem, pertence a todos e a ninguém.
Mas vista
de perto,revela o seu túrbido presente, sua
carnadura de pânico: as
pessoas que vão e vêm
que entram e saem, que passam
sem rir, sem falar, entre apitos e gases. Ah, o escuro
sangue urbano
movido a juros.São pessoas que passam sem falar
e estão cheias de vozes
e ruínas . És Antônio?És Francisco? És Mariana?
Onde escondeste o verde
clarão dos dias? Onde
escondeste a vida que em teu olhar se apaga mal se acende?
E passamos
carregados de flores sufocadas.
Mas, dentro, no coração,
eu sei,
a vida bate. Subterraneamente,a vida bate.
Em Caracas, no Harlem, em Nova Delhi,
sob as penas da lei,
em teu pulso,
a vida bate.E é essa clandestina esperança
misturada ao sal do mar
que me sustenta
esta tarde
debruçado à janela de meu quarto em Ipanema
na América Latina.
Ferreira Gullar
Não se trata do poema e sim do homem
e sua vida
- a mentida, a ferida, a consentida
vida já ganha e já perdida e ganha
outra vez.
Não se trata do poema e sim da fome
de vida,
o sôfrego pulsar entre constelações
e embrulhos, entre engulhos.
Alguns viajam, vão
a Nova York, a Santiago
do Chile. Outros ficam
mesmo na Rua da Alfândega, detrás
de balcões e de guichês.
Todos te buscam, facho
de vida, escuro e claro,
que é mais que a água na grama
que o banho no mar, que o beijo
na boca, mais
que a paixão na cama.
Todos te buscam e só alguns te acham. Alguns
te acham e te perdem.
Outros te acham e não te reconhecem
e há os que se perdem por te achar,
ó desatino
ó verdade, ó fome
de vida!
O amor é difícil
mas pode luzir em qualquer ponto da cidade.
E estamos na cidade
sob as nuvens e entre as águas azuis.
A cidade. Vista do alto
ela é fabril e imaginária, se entrega inteira
como se estivesse pronta.
Vista do alto,com seus bairros e ruas e avenidas, a cidade
é o refúgio do homem, pertence a todos e a ninguém.
Mas vista
de perto,revela o seu túrbido presente, sua
carnadura de pânico: as
pessoas que vão e vêm
que entram e saem, que passam
sem rir, sem falar, entre apitos e gases. Ah, o escuro
sangue urbano
movido a juros.São pessoas que passam sem falar
e estão cheias de vozes
e ruínas . És Antônio?És Francisco? És Mariana?
Onde escondeste o verde
clarão dos dias? Onde
escondeste a vida que em teu olhar se apaga mal se acende?
E passamos
carregados de flores sufocadas.
Mas, dentro, no coração,
eu sei,
a vida bate. Subterraneamente,a vida bate.
Em Caracas, no Harlem, em Nova Delhi,
sob as penas da lei,
em teu pulso,
a vida bate.E é essa clandestina esperança
misturada ao sal do mar
que me sustenta
esta tarde
debruçado à janela de meu quarto em Ipanema
na América Latina.
Ferreira Gullar
quinta-feira, 27 de dezembro de 2007
quarta-feira, 19 de dezembro de 2007
Por vezes,até há gente que parece SOL
No fundo, arrancamos estas peles
para vestir essas.
Depois, o tempo dirá. E o tempo diz sempre.
Mas em silêncio. Sem falar.
No fundo, trocamos de tripas,
oferecemos entranhas,
comemos esófagos uns aos outros
até digerir a solidão.
E por vezes, alguém surge do escuro
e dá-nos a mão. Seja ou não seja dono de cão.
Nesses dias, o sol parece gente.
Por vezes, até há gente que parece sol.
Depois, é caminhar, caminhar, caminhar.
É que no fundo, não temos lugar.
Manuel Cintra,Não sei nunca por onde começar
No fundo, arrancamos estas peles
para vestir essas.
Depois, o tempo dirá. E o tempo diz sempre.
Mas em silêncio. Sem falar.
No fundo, trocamos de tripas,
oferecemos entranhas,
comemos esófagos uns aos outros
até digerir a solidão.
E por vezes, alguém surge do escuro
e dá-nos a mão. Seja ou não seja dono de cão.
Nesses dias, o sol parece gente.
Por vezes, até há gente que parece sol.
Depois, é caminhar, caminhar, caminhar.
É que no fundo, não temos lugar.
Manuel Cintra,Não sei nunca por onde começar
Ma petite
Para ti, que és SOL
terça-feira, 18 de dezembro de 2007
segunda-feira, 17 de dezembro de 2007
domingo, 16 de dezembro de 2007
quinta-feira, 13 de dezembro de 2007
No more tears
Quantas vezes me fechei para chorar
na casa de banho da casa da minha avó
lavava os olhos com shampoo
e chorava
chorava por causa do shampoo
depois acabaram os shampoos
que faziam arder os olhos
no more tears disse johnson & johnson
as mães são filhas das filhas
e as filhas são mães das mães
uma mãe lava a cabeça da outra
e todas têm cabelos de crianças loiras
para chorar não podemos usar mais shampoo
e eu gostava de chorar a fio
e chorava
sem um desgosto sem uma dor sem um lenço
sem uma lágrima
fechada à chave na casa de banho
da casa da minha avó
onde além de mim só estava eu
também me fechava no guarda-vestidos
mas um guarda-vestidos não se pode fechar por dentro
nunca ninguém viu um vestido chorar
Adília lopes
Quantas vezes me fechei para chorar
na casa de banho da casa da minha avó
lavava os olhos com shampoo
e chorava
chorava por causa do shampoo
depois acabaram os shampoos
que faziam arder os olhos
no more tears disse johnson & johnson
as mães são filhas das filhas
e as filhas são mães das mães
uma mãe lava a cabeça da outra
e todas têm cabelos de crianças loiras
para chorar não podemos usar mais shampoo
e eu gostava de chorar a fio
e chorava
sem um desgosto sem uma dor sem um lenço
sem uma lágrima
fechada à chave na casa de banho
da casa da minha avó
onde além de mim só estava eu
também me fechava no guarda-vestidos
mas um guarda-vestidos não se pode fechar por dentro
nunca ninguém viu um vestido chorar
Adília lopes
terça-feira, 11 de dezembro de 2007
segunda-feira, 10 de dezembro de 2007
domingo, 9 de dezembro de 2007
sexta-feira, 7 de dezembro de 2007
quinta-feira, 6 de dezembro de 2007
aqueles que têm nome e nos telefonam
um dia emagrecem - partem
deixam-nos dobrados ao abandono
no interior duma dor inútil muda
e voraz
arquivámos o amor no abismo do tempo
e para lá da pele negra do desgosto
pressentimos vivo
o passageiro ardente das areias - o viajante
que irradia um cheiro a violetas nocturnas
acendemos então uma labareda nos dedos
acordamos trémulos confusos - a mão queimada
junto ao coração
e mais nada se move na centrifugação
dos segundos - tudo nos falta
nem a vida nem o que dela resta nos consola
e a ausência fulgura na aurora das manhãs
e com o rosto ainda sujo de sono ouvimos
o rumor do corpo a encher-se de mágoa
assim guardamos as nuvens breves os gestos
os invernos o repouso a sonolência
o vento
arrastando para longe as imagens difusas
daqueles que amámos mas não voltaram
a telefonar
Al Berto
(ainda a propósito do dia 1 de Dezembro, este poema magnífico)
um dia emagrecem - partem
deixam-nos dobrados ao abandono
no interior duma dor inútil muda
e voraz
arquivámos o amor no abismo do tempo
e para lá da pele negra do desgosto
pressentimos vivo
o passageiro ardente das areias - o viajante
que irradia um cheiro a violetas nocturnas
acendemos então uma labareda nos dedos
acordamos trémulos confusos - a mão queimada
junto ao coração
e mais nada se move na centrifugação
dos segundos - tudo nos falta
nem a vida nem o que dela resta nos consola
e a ausência fulgura na aurora das manhãs
e com o rosto ainda sujo de sono ouvimos
o rumor do corpo a encher-se de mágoa
assim guardamos as nuvens breves os gestos
os invernos o repouso a sonolência
o vento
arrastando para longe as imagens difusas
daqueles que amámos mas não voltaram
a telefonar
Al Berto
(ainda a propósito do dia 1 de Dezembro, este poema magnífico)
terça-feira, 4 de dezembro de 2007
Subscrever:
Mensagens (Atom)